segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Almofada Escarlate

Você está com ciúmes! - ela falou enfática.
- De você, com suas banhas tristes? - foi dizendo e saindo do quarto que já fora doce clausura.
Era tarde para o café da manhã. O sol apontou discreto, mas os ponteiros do relógio não se moviam. Solidão de mármore.
A mulher resmungou algo ininteligível. Soluçava?
A porta da rua estava trancada com um prego enferrujado. Saiu batendo a tramela. Um sabor amargo travava sua boca sem desjejum. Foi até a esquina à procura de um bar. Salivava quando entrou no recinto, mas não era fome.
A garçonete perguntou abruptamente o que queria. - Não sei. Tem ovos com bacon?
Ela voltou com o cardápio pobre. Só os operários almoçavam naquele lugar ou bebiam conhaque barato no balcão. Prato feito. Toalha oleosa de plástico surrado. Ela limpava as nódoas da mesa com um pano úmido que cheirava a ardido.
Ele olhou de relance o menu e escolheu uma salada de batatas com molho de mostarda marrom.
Comeu sem entusiasmo. Nem fome. Tomou uma caneca de chope escuro. Aliás, duas.
Caminhou pela praça pensando na vida que levava. - Seria nosso último diálogo? E as portentosas gargalhadas que dávamos na cama? E os beijos quando a possuía quente em meus braços?
Apesar do sol tênue, o tempo fez-se nublado e começou a chover. Chegou em casa encharcado. Abriu a porta e vislumbrou o aposento vazio. Fechou a janela. Sentiu-se miserável.
Os sapatos pingavam o chão de tábuas, formando poças disformes como se o piso fosse ceder. E cedia, a cada movimento seu. Ficou estático, observando o movimento da água inundar tudo.
Gotas corriam dos olhos. Deixou que rolassem livremente.
Foi aí que notou uma cadeira nova na sala. E também uma almofada escarlate. Seus lábios tremeram.
- Esses objetos já estavam aqui? Que bobagem... - mas estancou tomado por indescritível emoção.
O relógio continuava parado.

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